terça-feira, 22 de maio de 2007

“O papel do autarca na regulamentação do uso dos solos”-oração à Conferência da Moita por Luís Nascimento (PPD-PSD, CDS-PP e MPT), Vereador CM Moita









“O papel do autarca na regulamentação do uso dos solos” oração apresentada à Conferência da Moita por Luís Fernando Vaz Nascimento (PPD/PSD/CDS-PP), Vereador à Câmara Municipal da Moita eleito nas Listas da Coligação “Construir o Futuro”, com o apoio do PSD Partido Social-democrata, do CDS - Partido Popular e do MPT Movimento – Partido da Terra.

Minhas, Senhoras, Meus Senhores,

Todos nós, ao virmos para esta conferência, temos um objectivo: Que ela seja o ponto de partida para uma reflexão profunda sobre política de solos e urbanismo em Portugal.

É normal, este tipo de eventos, ser organizado de forma diferente, o normal é existirem painéis onde académicos com grande conhecimento cientifico falem, depois outros painéis onde autarcas falem, outros painéis ainda onde deputados, aqueles que na Assembleia da República fazem as leis, usem da palavra e painéis onde a população com o seu conhecimento feito da experiência e da observação, usem por sua vez da palavra.

Esta conferência não foi organizada nesses moldes.

Em quase todos os painéis teremos académicos, autarcas, deputados e população.

A troca de experiências em cada painel, parece-me assim, bem mais rica e será certamente mais profícua que noutros eventos.

Quis a organização que eu usasse da palavra neste primeiro painel, onde o conhecimento científico está a cargo do Professor Bingre do Amaral e da Drª. Ana Cristina Bordalo, e o representante da Assembleia da República o Dr. Francisco Louça – todos eles, pessoas que granjearam em todo o País um profundo respeito e admiração.

E este facto, deixa-me profundamente honrado.

(Não sei o que eles pensarão de o autarca que com eles partilha a mesa ser a minha modesta pessoa.)

Um fenómeno que é natural que aconteça, durante toda esta conferência, será uma certa troca de acusações entre os deputados e os autarcas, com estes últimos a referirem a urgência numa mudança de algumas leis, e os primeiros a exigirem responsabilidades aos autarcas, pelo meio os académicos e a população saberão exigir a ambos uma mudança de mentalidades.

É que, como em tudo na vida, não há um responsável sozinho… O caos urbanístico que hoje reina em Portugal, tem a sua responsabilidade partilhada por todos, autarcas, deputados e também universidades, académicos e população.

Não quero tornar a minha intervenção demasiado longa, sei que muitos de vós querem aproveitar o tempo de debate para colocarem algumas questões, e como tal, entrarei directo nos principais assuntos.

O que me parece importante é que esta conferência lance o debate sobre a legislação do uso dos solos; é que o legislador publicou toda a legislação regulamentadora da Lei de Bases do Ordenamento (DL 380/99 – este mais tarde modificado pelo DL 310/2003, o DL 555/99 – sobre o regime jurídico da urbanização e da edificação e ainda o DL 168/99 – Cod. de Expropriações) mas esqueceu-se de actualizar a Lei 794/76 (Lei de Solos) que foi feita num contexto muito diferente do actual.

Usarei assim, o meu tempo de antena, para pressionar os deputados presentes a realizarem esta discussão. Servindo para a relançar, e fechar a “quadratura do círculo” com o quarto diploma que falta.

Na lei 48/98 onde se estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo, nos seus princípios gerais (o seu artigo 5º) destacava que o ordenamento do território devia obedecer a alguns princípios gerais:

Artº 5 da Lei 48/98

A politica de ordenamento do território e de urbanismo obedece aos pricipios gerais de:

  1. Sustentabilidade e solidariedade intergeracional (…)
  2. Economia assegurando a utilização ponderada dos recursos naturais(…)
  3. Coordenação – compatibilizando com politicas de desenvolvimento económico e social e na ponderação de interesses públicos e privados. (…)
  4. Subsidiariedade – promovendo o nível decisório mais próximo do cidadão. (…)
  5. Equidade (…)
  6. Participação (…)
  7. Responsabilidade (…)
  8. Contratualização (…)
  9. Segurança jurídica (…)

Sobre este primeiro conceito de solidariedade intergeracional, infelizmente muito pouco foi feito.

Os recursos naturais dos nossos solos têm sido esbanjados pela actual geração, num amanhã, que será mais cedo do que alguns imaginam, teremos um País sem soluções e uma nova geração que certamente nos pedirá contas.

Sobre o segundo conceito, se é verdade que todas as grandes infra-estruturas, todas as grandes urbanizações, já se apresentam com um estudo de impacto ambiental, o seu estudo de impacto económico é muitas vezes esquecido.

Se recuarmos vinte anos, olhamos um Portugal muito diferente.

Com as novas vias de acesso, então criadas, surgiram novas cidades:

Quem morava num apartamento em Massamá, comprou agora uma vivenda em Torres Vedras pelo mesmo preço, fazendo a sua deslocação até ao seu local de trabalho em menos tempo do que anteriormente, e tendo naturalmente uma melhor qualidade de vida.

O aparecimento das universidades locais, e de outros serviços essenciais, também contribuiu.

Nasceram assim, as cidades intermédias.

Inicialmente desordenadas, logo surgiram programas que visavam emendar os erros cometidos – Inicialmente o programa Prosiurbe a que se seguiu os programas Polis.

O emendar um erro, é sempre pior que não o cometer… e teria sido possível evitar esse erro, se se tivesse pensado em cada momento no Impacto ambiental, mas também no económico de cada infra-estrutura.

Num país de pequenas dimensões, como Portugal, num mundo onde as distâncias tendem a encurtar, brevemente não haverá nenhum espaço que não seja apetecível para a construção de habitação – pois é este o uso mais rentável para um pedaço de terreno.

Os promotores imobiliários, pressionam cada autarquia por forma a defenderem os seus empreendimentos, os autarcas, por sua vez, encaram o crescimento habitacional como fundo de receitas para a autarquia, e correm a aceitar cada proposta.

Para termos a ideia do ponto a que chegámos, basta dizer, que se todos as habitações já permitidas nos diversos PDM’s de todos os Concelhos fossem construídas, Portugal teria neste momento 40 milhões de habitações.

40 milhões de casas, num país com 10 milhões de habitantes.

Considerando o núcleo familiar médio de três pessoas – ou seja cada casal ter um só filho, isto daria uma necessidade de 3 milhões de casas… com 40 milhões significa que seria em média 10 casas para cada família portuguesa!

E ninguém vê o ridículo a que chegámos!

Existem 3 agentes com quem o autarca tem que saber lidar, nesta questão. Cada um deles com um modo de pensar distinto.

O primeiro, é o dono do terreno – o proprietário clássico:

O normal proprietário considera o seu terreno uma poupança, por principio defende em alta, não o deseja vender… considera-o a sua garantia para um futuro difícil.

Depois há o Promotor Urbanizador, este sim, quem fica com as mais valias, que consegue convencer o proprietário a vender-lhe em baixa o terreno, e depois, muitas vezes através de uma influência sobre o gestor público, transformar o terreno em zona urbanizável.

Finalmente o Promotor Construtor. A explicação de como é que num país que possui fogos a mais a sua venda é tão cara, encontra-se na forma de agir dos construtores.

É que, se a lei da oferta e da procura funcionasse, seria natural que o preço da habitação em Portugal fosse muito mais barata do que é na realidade.

Temos excesso de casas, temos mais oferta que procura, e no entanto, a habitação em Portugal é das mais caras da Europa!

Isto acontece porque o pequeno construtor, elabora os seus preços ao contrário:

Ele pensa: Aqui faço um prédio de X fogos, que vendo por Y

Depois de Y subtrai os seus custos de construção, o lucro que deseja, os juros do empréstimo que terá de efectuar e o que sobra é o valor que ele está disposto a pagar pelo terreno.

Desta forma, o preço do terreno já urbanizado é sempre inflacionado.

Uma vez mais é o Promotor Urbanizador que ganha a maior fatia.

Sem se aperceber que é a sua própria lógica que um dia destruirá o seu negócio, o pequeno construtor, faz o negócio do Grande promotor imobiliário.

Existe ainda um quarto lado neste triângulo, onde o autarca tem que se mover:

Os bancos!

Que ninguém se iluda, o mercado financeiro mexe no mercado fundiário.

Ou seja, a maior fatia deste mega negócio fica nas mãos de um quase intermediário, de alguém que somente entra no negócio para obter da parte da autarquia uma licença de urbanização.

No Norte da Europa, em países como a Suécia, o direito de posse de um terreno e o direito edificandi, ou seja o de lá construir, são duas questões totalmente distintas, que podem mesmo ser vendidas separadamente.

O direito edificandi é à partida do estado!

Já na Europa central, na Alemanha ou na França, o direito de posse está ligado ao direito edificandi.

Pessoalmente, há muito que defendo um sistema mais próximo do sistema do norte europeu… mas essa decisão acabaria com o negócio do Grande Promotor Imobiliário e haverá sempre interesses para que tal não aconteça.

Não me quero alongar em demasia pois penso que muitos de vós quererão aproveitar para colocarem as vossas questões… uma conferência é isso mesmo, e não uma palestra.

Mas não queria deixar de aproveitar a oportunidade de ter alguns deputados a ouvirem-me, e por deputados entenda-se legisladores, para solicitar ainda uma reflexão sobre uma lei que é urgente mudar.

É que há um outro decreto lei, que me parece criticável…

Alguns vão achar estranho ser eu, vereador do PSD, a levantar esta questão, pois o mesmo foi feito no governo do Prof. Cavaco Silva.

A lei do diferimento tácito!

Na época, qualquer investimento ficava parado tempo sem fim nas Câmaras municipais… era urgente mudar isso, e surgiu o diferimento tácito

Ou seja: se ao fim de algum tempo a autarquia não respondesse o projecto estaria tacitamente aprovado

Eu compreendo a medida na época e na época era correcta.

Infelizmente, no nosso país somos mestres em dar a volta ao texto, e esta lei é hoje responsável por muitos crimes ambientais e abre portas a muita corrupção:

Um exemplo, o empreendimento do Champalimaud em Sintra, onde há alguns anos atrás o pedido de parecer foi “esquecido” por um mero funcionário da Câmara numa gaveta até o prazo passar, e agora a autarquia debate-se na procura de uma solução.

Este decreto, torna passível de ser aliciado por corrupção, qualquer mero contínuo de uma Câmara Municipal.

O que devia existir era indeferimento tácito, com uma fácil contra-resposta para tribunal por parte do promotor.

Deixo aqui aos deputados que hoje estão presentes esse desafio. Porque há questões que são urgentes de modificar!

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Neste espaço surgirão artigos e notícias de fundo, pautadas por um propósito: o respeito pela Lei, a luta contra a escuridão. O âmbito e as preocupações serão globais. A intervenção pretende ser local. Por isso, muito se dirá sobre outras partes, outros problemas e preocupações. Contudo, parte mais significativa dos temas terá muito a ver com a Moita, e a vida pública nesta terra. A razão é uma: a origem deste Blog prende-se com a resistência das gentes da Várzea da Moita contra os desmandos do Projecto de Revisão do PDM e contra as tropelias do Processo da sua Revisão, de 1996 até ao presente (2008...) Para nos contactar, escreva para varzeamoita@gmail.com